Thursday, October 27, 2005

Do Sombras difusas, blog da Kátia Abreu, produtora de Stela Campos e mais uma pá de bandas

Medo e delírio em Curitiba

Curitiba é um cu, provinciana e tal. Fato, todo mundo diz isso. Mas mesmo assim, eu gosto da cidade. Por um motivo muito simples: qualquer lugar pode ser um bom lugar, se você tiver boas companhias. E, felizmente, eu só conheci curitibanos legais até hoje. Talvez por isso, meus amigos de lá não só concordem com as afirmações acima sobre a cidade deles, como estejam quase todos na pilha de sair de lá. Pois bem. Já fui algumas vezes para lá, sempre bem acompanhada também. No último fim de semana, fui com a Stela para tocar no Rock de Inverno. A Adri e o Ivan são ótimos anfitriões. Nos esperaram por duas horas na rodô, por conta de um atraso monstro do nosso bus. E quando desembarcamos, lá estavam eles com largos sorrisos para nos receber e nos acomodar. Gosto da estrada e tenho tido sempre boas surpresas nela. Não só de gente que acabo conhecendo por aí, mas muito especialmente de me aproximar mais dos meus companheiros de viagem. Eu discordo de quem acha que é preciso manter uma distância segura entre vida profissional e pessoal. Sempre trabalho com mais gosto quando sinto que estou entre amigos. Problemas e estresses naturais são mais facilmente resolvidos assim. Além do mais, quando se ganha pouco, se a gente não se diverte um pouco também, as coisas ficam meio sem sentido. Podem chamar de "amor à causa" se quiserem. Mas como eu não sei que causa é essa, prefiro dizer que tenho amor pelos amigos, pela boa música e por meia dúzia de sonhos e princípios meus. Só isso. O show foi muito bom. Está cada vez mais rock. Um doido veio até o backstage enquanto eles estavam arrumando o palco e me perguntou que tipo de som era. Consegui sintetizar tudo em "mistura Flaming Lips e Velvet Underground". Depois o guri veio me dizer que tinha gostado muito e que a minha definição tinha feito sentido para ele. Foi tão rock a coisa que na última música ("Girl From 33"), sabe deus como, o ampli de baixo caiu. E caiu no pé do Maestro Viena. Gelo, hospital, uma luxação, um anti-inflamatório e prontinho, o moço já estava quase bom na nite conosco. Vida lôka é assim, mano.Outro fato: onde quer que seja, os doidos sempre se reconhecem uns aos outros. Deve ser por isso que eu nunca conheci gente chata e provinciana em Curitiba. Desta vez, não foi diferente. Primeiro, foi o adorável técnico de som do festival. Depois, uma linda garçonete. Quando fomos expulsos do primeiro bar - todos doidos, sem aguentar mais tomar cerveja, intrigados com a cara de tédio do Iggy Pop num cartaz e encantados por um outro Stooge, doravante conhecido por nós apenas como "Dentinho" - enfim, quando as luzes se acenderam e fomos postos porta a fora, obviamente dormir não era uma idéia. Graças a Carol, que, ao fim de seu expediente, nos enfiou todos em seu super carro e nos levou pra uma corrida absurda até um afterhours, pudemos continuar a saga noite a dentro. O único erro era a música do lugar. Um bate estaca sem sentido, um tanto insuportável para roqueiros. E as peculiaridades curitibanas: Mr. Punk Natureza nos apresentava um espetáculo de moderna dança frenética no lounge, quando se aproxima um segurança (que parecia, na verdade, um bedel de colégio) e informa que não, não podia dançar ali, dançar era na pista. Strange. Nunca tinha visto restrições desse tipo. E até onde me lembro, não havia placa de proibido dançar. De modo que, se a gente estava escutando aquele som repetitivo e chato no mesmo volume que na pista, que mal havia em deixar o rapaz sacolejar por ali? É, definitivamente esse moço tem uma dívida cármica com a cidade. Tudo culpa do boneco mod. Cansamos. Não da noite. Isso nunca. Mas do bar, da cerveja e daqueles bpms acelerados demais. "Vamos andar por aí". A gente certamente teria ido parar em algum lugar estranho, poderiamos até ter vindo a pé para São Paulo, não fosse o doce Luigi guiando a viagem. Vagamos por ruas de paralelepípedos. Ora em Curitiba, ora em Recife, ora em Buenos Aires e até em Roma passamos. Hahaha. Uma cidade fora do tempo e do espaço, a nossa. Com paredes ornadas por cartazes com a figura de Jesus Cristo e a inscrição "Açúcar" embaixo. Isso existe. Não foi uma alucinação. Há fotos para provar. Deve ser algum tipo de profecia. É bonito olhar a cidade amanhecer, o dia ficando claro, mas as luzes da rua ainda acesas. As fotos ficam lindas. Tenho a impressão de que continuaríamos andando para sempre, não fosse o céu começar a escurecer e nuvens horrendas se aproximarem de nós. "Vamoae, que o Katrina está chegando e vai pegar a gente". Timing perfeito, alcançamos o café da manhã do hotel no exato momento em que a chuva desabou. Sem graça a chuva, durou pouco, só serviu para nos afugentar. Dormir continuava não sendo uma idéia para mim, mesmo depois de falar e andar por horas e horas e alguns de nós terem se retirado. Me embrenhei numa conversa idealista com o querido cicerone. Muitos cigarros, várias idéias, alguns planos. Não sei dizer por quanto tempo. Não existiu tempo mensurável para mim durante essa noite eterna. Despedidas, reencontros previstos. Partiu e eu me parti novamente. Aquela velha história de deixar um pouco de si e levar um pouco do outro. Mais boas lembranças para alimentar a minha suave melancólia. Dormi algumas horas. Poucas. No fim de semana todo, aliás, dormir foi uma necessidade ignorada. Acordei e a viagem ainda não tinha acabado. Arrumamos as malas e fomos para a rodoviária. Despedimos dos nossos anfitriões. Embarcamos de volta para São Paulo. E embarcamos de volta pelas fotos em tudo o que havia acontecido. Não sei, mas desconfio que poucas vezes eu ri tanto e tão continuamente na vida. Hahahaha. Tenho que concordar com o señor Tony Espanha. Foi um fim de semana perfeito. Perfeito dentro do caos, dos imprevistos e da loucura. [Perfeito demais para ser descrito com exatidão. Mas é bom recordar, contar para os amigos como foi tudo e escrever esta espécie de diário de viagem, cheio de piadas internas que eu não vou explicar e não me importo se alguns de vocês não entenderem. Na real, pouca gente vai entender tudo. Só quem estava lá e viu as mesmas paradas. Mas dane-se. Texto flashback. Pros vida lôka, mano.]

2 Comments:

Blogger Leo Vinhas said...

Cara, que texto chato! E a mina nem falou das outras bandas, parece que só conta o umbigo dela!
Viva Gruvox! Vivao OAEOZ! Viva Terminal Guadalupe e Góticos 4 Fun, e Deus nos proteja dos efeitos do La Carne!

3:43 AM  
Blogger katia abreu said...

leonardo, não é um texto sobre o festival. é um texto sobre a minha viagem. sobre o meu umbigo, escrito no meu blog. o ivan pediu se podia republicar aqui, e eu concedi a permissão.

10:28 PM  

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